quarta-feira, 29 de junho de 2016

A reprimarização da economia brasileira e a PEC 65: um retrocesso que nos leva de volta à década de 1970. Entrevista especial com Eduardo Luis Ruppenthal
Por Patricia Fachin - IHU (28-06-16)
“Esse é um momento difícil pelo qual o país está passando e pode significar um profundo retrocesso em várias conquistas constitucionais, avanços sociais e ambientais desde o processo de redemocratização brasileira”, denuncia o biólogo.


Se aprovada, a Proposta de Emenda à Constituição – PEC 65 irá “afetar” a atual legislação de licenciamento ambiental brasileira, ao permitir que obras sejam realizadas “apenas com a apresentação de estudos iniciais pela própria empresa, sem o cumprimento das demais etapas”, adverte Eduardo Ruppenthal à IHU On-Line.

Atualmente, o licenciamento ambiental é determinado em três etapas: a Licença Prévia – LP, a Licença de Instalação – LI e, por fim, a Licença de Operação – LO, mas “a PEC 65 propõe a extinção das duas últimas etapas, eliminando uma série de prerrogativas fundamentais e importantes no que diz respeito a direitos ambientais e sociais, principalmente daqueles que são atingidos pela obra”, explica.

Na entrevista a seguir, concedida por e-mail, Ruppenthal frisa que a PEC 65 está inserida num “contexto mais amplo, do atual modelo brasileiro de uso, exploração e exportação dos recursos naturais, formado principalmente pelo tripé agro-hidro-mineronegócio, que não aceita ser regulado e não quer abrir mão de sua lucratividade máxima”. A alteração na legislação, pontua, faz parte da proposta brasileira de continuar investindo no modelo agroexportador e visa “facilitar o escoamento dos recursos energéticos e as commodities agrícolas e minerais, diminuindo os custos operacionais, ajustando a nossa economia aos interesses do mercado globalizado e às empresas transnacionais”.
Eduardo Ruppenthal também lembra que a “corrupção está inerente” às propostas de alteração da legislação ambiental brasileira e à realização de megaobras, como aconteceu durante o Regime Militar, com a construção dahidrelétrica de Itaipu e a construção da Transamazônica, e como ainda acontece nos dias de hoje, com a construção de Belo Monte. “Além da convergência da visão de desenvolvimento entre os governos e o setor privado, há uma relação mais promíscua que sempre foi denunciada, mas agora está sendo elucidada com a Operação Lava Jato, embora antes não fossem poucas as notícias e denúncias sobre favorecimentos às grandes empreiteiras e outras empresas subsidiárias de insumos, como ferro, cimento e equipamentos elétricos”, conclui.
Eduardo Luis Ruppenthal é biólogo e mestre em Desenvolvimento Rural pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS. Atualmente é professor da rede pública estadual.

domingo, 5 de junho de 2016

Na Semana do Meio Ambiente, para pensar seriamente em sustentabilidade na UFRGS, vamos de Chapa 1, Virada Plural de Democrática!

A humanidade e a biodiversidade passam por momentos tremendamente graves. Temos, neste milênio, os 15 anos com as temperaturas mais elevadas da história. O ano de 2015 foi o que registrou maior temperatura média da atmosfera já vista em nosso planeta. E isso vem acompanhado, cada vez mais, de eventos climáticos extremos, como tempestades, enchentes e secas. As emissões de gases de efeito estufa seguem crescendo. O gás carbônico - que representa 53% dos GEE - já ultrapassou mais de 400 ppm - partes por milhão - de CO2) na atmosfera da Terra. Os demais GEE, derivados de combustíveis fósseis como o CH4 (metano), o N20 (óxido nitroso) e o CFC (clorofluorcarbono), também crescem seus níveis na atmosfera. 

Padecemos de um modelo perdulário e energívoro baseado em combustíveis fósseis e também em hábitos criados pela chamada sociedade de consumo, levada a adquirir produtos com obsolescência programada. O uso energético do petróleo, do carvão mineral e das hidrelétricas representa a mesmice de investimentos em grandes fontes de gases de efeito estufa e altamente poluentes. Os reservatórios das hidrelétricas, ao contrário do senso comum, não são fontes limpas, pois extinguem peixes de piracema, destroem matas ciliares e são também responsáveis pela emissão de grande quantidade de gás metano.

A Biodiversidade mundial passa pela Sexta Extinção em Massa, agora de origem antrópica, melhor dizendo, econômico-crematística. A Biosfera sofre o rompimento de seus ciclos, de forma alarmante, derivada da economia neoclássica que reina esquecendo-se de contabilizar os custos ambientais do esgotamento dos recursos naturais e da poluição. A crise ecossistêmica resulta de se ultrapassar a capacidade de suporte dos sistemas naturais da Terra. Sonega-se o custo da não reciclagem, do aumento da água poluída, da derrubada da floresta ou dos campos biodiversos, como no caso do Pampa, convertidos em sistemas simplificados e disfuncionais, onde impera a acumulação de terras e de grãos em grande escala.

Os países periféricos, como o Brasil, vivem da exportação de matérias primas (commodities), como o minério de ferro, o petróleo, os grãos. Temos uma agricultura altamente dependente de insumos e biocidas e outros produtos derivados do petróleo - este com seus dias contados – sofrendo múltiplos efeitos colaterais desconsiderados, como a perda de água, perda de biodiversidade e de solos, emissão elevada de GEE, intoxicação por agrotóxicos. Uma agricultura de “precisão”, pois precisa de insumos e de subsídios do governo.

No Brasil, a agricultura empresarial consome mais de 200 bilhões de reais de programas do governo federal, que poderiam ser usados em diversificação e em atividades produtivas mais sustentáveis. A balança comercial é favorecida pela soja. Mas não se fala da reprimarização da economia brasileira que esteve associada à desindustrialização nacional. Tampouco se fala nas consequências, como secas, chuvas intensas e o preço flutuante internacional das commodities. A história já avisou: o Brasil sofreu imensos desastres econômicos e ambientais associados a quebras de safra ou de mercado de monoculturas de cana e café. São Paulo ficou recentemente sem água. Por quê? A água depende das florestas e de vegetação natural. A resiliência depende da diversidade! 

O modelo econômico privilegia a vulnerabilidade, favorecendo o capital financeiro e as grandes corporações. É imposto à sociedade um modelo mundial do século passado, que privilegia 1% da população do planeta que detém 99% da riqueza mundial. Desigualdades sociais também são desequilíbrios ambientais, que compartilham causas comuns.

Neste modelo, retomado pela volta do neoliberalismo, é impossível buscar-se o equilíbrio ecológico. Como diz Michael Lowy, o modelo atual, que sofre da obsessão pelo crescimento econômico ilimitado (para poucos), pode ser comparado como um trem descontrolado em direção ao abismo. E somos seus passageiros, submetidos à retomada da aceleração deste trem, ajustado para favorecer ainda mais a primeira classe! Portanto, a crise sistêmica requer atenção e ações emergenciais!
Necessitamos de desacelerar a economia suicida, como bem diz o economista e filósofo Serge Latouche, investindo em fontes renováveis e mais sustentáveis como as energias solar, eólica, e aquelas derivadas de resíduos biológicos (biogás e outras formas de transformação de bioenergia). Isso requer mais pesquisas e incentivos governamentais.

Temos que enfrentar estes múltiplos processos que estão rompendo o funcionamento da natureza. Também temos que enfrentar os retrocessos na área da desregulamentação trabalhista, ambiental e dos direitos sociais. A legislação ambiental brasileira tem conquistas que devem ser defendidas contra ataques parlamentares e tentativas de mudanças que correspondam a profundos retrocessos. A integração de ações com aqueles que mais precisam de atenção, no caso a população pobre, também é urgente!

Substituir as armadilhas das palavras “competitividade” e “inovação de mercado” por cooperação e resgate da sustentabilidade, dentro de uma universidade socialmente referenciada. Queremos maiores incentivos às pesquisas com as policulturas de produtos orgânicos e agroecológicos e, paulatinamente, vermos a substituição dos combustíveis fósseis por outras fontes renováveis e sustentáveis. Precisamos de desconcentração de terras e de incorporação de agrobiodiversidade, sem patentes privadas sobre seres vivos.
Nas universidades, poder-se-ia dar um salto nisso no âmbito da aquisição dos produtos para as refeições dos restaurantes universitários (RUs) que podem e devem ser adquiridos, de forma justa, como meta de se atingir 100% dos alimentos consumidos pela comunidade universitária de parte da agricultura familiar e ecológica. Mais feiras de orgânicos e produtos agroecológicos em nossos Campi!

Acreditamos que uma necessária transição para um mundo sustentável passará, obrigatoriamente, por conhecermos melhor nossa biodiversidade, nosso ambiente e investirmos na responsabilidade socioambiental de parte das universidades, centros de pesquisa e demais órgãos públicos, mudando hábitos e incorporando diálogos e trocas de saberes entre a população e a comunidade acadêmica.

Acreditamos no incremento nas ações de educação ambiental em parcerias entre universidades e escolas. Temos que lutar por integração em ensino, pesquisa e extensão (comunicação) dentro de um outro paradigma, menos produtivista e longe da tecnociência de mercado, que  vislumbre um mundo compatível com a vida diversa para as gerações atuais e futuras, sem abdicar de nossa excelência. Um mundo que dê destaque às tecnologias sociais e cooperativas no campo e na cidade!

A mudança passa por democracia e reflexão quanto ao atual quadro de crise socioambiental para encontrarmos caminhos via modelos que reconectem os seres humanos entre si e com a natureza. E a nossa Universidade Federal do Rio Grande do Sul deve ter um papel de destaque nisso, definitivamente.

Para isso, é importante a construção de um Plano Diretor que defina a expansão, com respeito às áreas verdes e à qualidade ambiental, conjugado a uma Política Ambiental de gestão integrada e comprometida com sustentabilidade. Implantação de uma política que implique em uso racional de energia, água e materiais, com reciclagem, espaços de convivência com a natureza, com forte incremento em saneamento. Pela criação definitiva de uma Unidade de Conservação do Morro Santana, aliando pesquisa, aulas de graduação, extensão e educação ambiental, com segurança e estrutura compatíveis.


Por isso, tendo em vista o processo eleitoral para a Reitoria da UFRGS, no dia 16 de junho, recomendamos, por parte da comunidade universitária, o voto na Chapa 1, “Virada, Plural e Democrática”, composta pelos candidatos a Reitor, Carlos Alberto Gonçalves, e a vice, Laura Verrastro, já que estes colegas comungam das mesmas preocupações e se comprometerão com um processo coletivo que construa maior sustentabilidade ambiental tanto internamente como em conjunto com a sociedade.