No Dia do Biólogo, cabe o alerta
referente à situação da profissão que mais está ligada à vida e que também está
sob o alvo da política rasa, dos fundamentalistas do crescimento econômico e do
suposto resultado direto do que costumam chamar de desenvolvimento. Para isso, sempre é importante trazermos o
contexto mundial e também nacional ou local para esta abordagem.
Em nível mundial, temos um cenário dramático
da Sexta Extinção em Massa, reconhecida pelo desaparecimento em massa de muitas
espécies, situação que ocorreu em períodos de dezenas ou centenas de milhões de
anos devido a fenômenos naturais. Hoje, o fenômeno está sendo provocado pelas
atividades econômicas ligadas a um modelo de crescimento ilimitado e
concentrador, que quebra enormemente os ciclos biogeoquímicos da Biosfera e
altera o clima planetário, com resultados catastróficos, anteriormente, pouco
comuns. Modelo este que, em suma, degrada a natureza e compromete a vida das
pessoas e o futuro das novas gerações. E
em uma economia que concentra renda inédita, onde 1% da população mundial alcança a riqueza
econômica equivalente ao restante dos 99% dos habitantes do planeta, sendo que os
argumentos da lógica econômica reinante caem por terra.
No cenário nacional, seguimos sendo um país, como
nossos vizinhos latino-americanos, exportador de matérias primas, com altíssima
carga de esgotamento de recursos naturais e graves efeitos socioambientais
colaterais, denominados de “externalidades”. Como exemplo, dos resultados nem
sempre computados da economia, no final do ano passado, assistimos o maior
desastre ambiental provocado pelo rompimento da barragem da mineradora Samarco,
do grupo Vale e BHP, em Mariana (MG). Quase duas dezenas de mortos,
centenas de lares e milhares de hectares de áreas de ecossistemas terrícolas e
aquáticos destruídos, tudo isso para exportar milhões de toneladas de minério
de ferro e "desenvolver" o país, voltando à lógica colonial. Assistimos
a vida comprometida novamente pela ganância empresarial e negligência governamental.
Enquanto isso, igualmente, segue no campo a supremacia a do modelo
exportador , representado pelas commodities
em escala extraordinária, com monoculturas de grãos, em especial a soja, para alimentar
animais confinados em outras paragens, comprometendo ecossistemas originalmente
florestais e biodiversos. No bioma Pampa, se plantam árvores, e na Amazônia se
plantam capins e lavouras de plantas não florestais. A venda de agrotóxicos, mesmo com as lavouras
transgênicas, segue sendo campeã no Brasil.
Nas áreas urbanas, o apelo é para o
consumo de bens de baixíssima durabilidade, como automóveis, por exemplo, a
despeito da necessidade de investimentos em transporte público. A chamada infraestrutura, inclusive
energética, baseada no resgate ao poluente carvão mineral e na retomada de megahidrelétricas
sobre a Amazônia, é prioritária para
manter o círculo vicioso exportador de uma economia sem perspectiva de futuro. Degradar a natureza segue sendo um bom negócio, para quem controla a economia.
Neste momento, após o fatídico 31 de agosto, aprofunda-se o caminho insustentável, que poderá ser levado a cabo pelo grupo
político mais corrupto e que assaltou o poder, num forjado “impeachment”, num cenário
obscurantista de negócios escusos, via bancadas ruralistas, da mineração, da
bala, e assim por diante.
Neste panorama pavimentado para o retorno
do neoliberalismo, o costumeiro laissez-faire
atropelador da legislação ambiental tende a vir mais forte. Vários projetos de lei tramitam no Senado e na Câmara com este intuito. E, paradoxalmente, este e outros profissionais,
no caso do biólogo, que mais estudam e trabalham para a gestão e o resgate da vida ecossistêmica com maior
equilíbrio estão sofrendo e perdendo espaço de trabalho.
Os órgãos ambientais, sob a lógica crematística, governados por políticos de visão meramente eleitoral, financiados por empresas degradadoras, impõem forte restrição à atuação do biólogo e de outros
profissionais da área ambiental, que emprega, ou deveria empregar, muita gente. Os estudos de impacto
ambiental de baixa qualidade acabam sendo forçados a serem aceitos, por parte
de chefias, desqualificando trabalhos importantíssimos e mantendo a
mediocridade e a propaganda enganosa por parte de empresas nos EIA-RIMAs.
Sendo assim, não nos resta outra alternativa
que reverenciarmos o preparo técnico e nossas armas, via valorização de nossa biodiversidade vilipendiada, o conhecimento biológico na saúde, entre outras
áreas, e irmos para a luta denunciando o ataque à nossa profissão, resgatando a
economia verdadeira e a ecossoberania nacional. Os indicadores ambientais nunca
estiveram tão de nosso lado. Existem milhares de espécies em via de extinção, e
isso agora ninguém mais pode negar. As mudanças climáticas de origem da
economia “business a usual” também são incontestáveis. Os ecossistemas e os
biomas brasileiros devem ser melhor estudados, manejados e mantidos, também
gerando renda quando possível, de forma sustentável, combatendo-se as
monoculturas, inclusive as pesquisas que as incrementam. Os cursos de água e a
atmosfera necessitam estudos com bioindicadores e monitoramentos, bem como a saúde
humana depende da saúde ambiental.
Temos várias espécies desconhecidas para
a Ciência. Algumas estarão desaparecendo embaixo de um megaempreendimento, sem
sequer sabermos de sua existência. Temos, por exemplo, cinco mil espécies de
plantas alimentícias e de outros tantos usos que dependem de biólogos,
agrônomos, nutricionistas e outros profissionais para seu maior desenvolvimento
aqui, já que dezenas delas já são alvo de biopirataria e fazem parte
privilegiada da economia de outros países. Os diferentes órgãos de saúde e de
meio ambiente devem valorizar este tema, que depende do conhecimento do biólogo.
O trabalho técnico não deve se curvar ao assédio moral, situação que é considerada crime, pois representa tentativa de impor o silêncio a este profissional que defende a vida. Situações que
acontecem rotineiramente devem ser colocadas para fora e denunciadas, inclusive
com processos na Justiça. Nisso, é necessário que não se tenha medo de delatar
este tipo de ação no serviço público e também privado, em especial
nos órgãos ambientais. Os chefes das pastas ambientais em todos os âmbitos, que
tentam impor aos profissionais da área ambiental sua ingerência política, devem
receber um basta de parte da Justiça. E os profissionais que trabalham na área
técnica devem ter estabilidade, via realização de concursos, para que possam
exercer de sã consciência sua profissão.
Mas para isso, o tratamento destes temas e a superação desta situação de estrangulamento da profissão, num dos momentos de maior necessidade, os Conselhos Federal e Regionais de Biologia, os Sindicatos de Biólogos e outras
agremiações, organizações ou articulações tornam-se fundamentais para que o
biólogo consiga exercer sua profissão, plenamente, com dignidade e alegria.
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