quarta-feira, 3 de dezembro de 2025

DIA 3 DE DEZEMBRO, INGÁ E SER AÇÃO REITERAM A LUTA CONTRA OS AGROTÓXICOS E PELA JUSTIÇA SOCIOAMBIENTAL NO CAMPO E NA CIDADE!

Nossas entidades, InGá e Ser Ação – Ativismo Ambiental, querem lembrar a importância de 3 de dezembro, como o Dia Internacional de Luta Contra os Agrotóxicos. A data corresponde ao mesmo dia de dezembro de 1984, portanto há 41 anos, quando ocorreu explosão e vazamento de produto inseticida (isocianato de metila) em uma indústria da Union Carbide, em Bhopal, na Índia, causando cerca de 3,8 mil mortes no momento do acidente e mais de 20 mil óbitos em períodos seguintes em decorrência de doenças respiratórias e outras enfermidades ligadas ao desastre. A empresa estadunidense, adquirida posteriormente pela Dow Chemical, marcou o maior acidente industrial com tantas mortes associadas à impunidade corporativa. Passadas quatro décadas, o próprio governo local tenta buscar, sem sucesso, uma sentença condenatória contra a empresa e reparação à população atingida e seus familiares pelo crime decorrente do descaso dessas indústrias de venenos que contaminam as populações.





É importante lembrar que os primeiros agrotóxicos surgiram a partir de armas químicas, para matar seres humanos "inimigos" durante a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), sendo depois desenvolvidos e aprimorados na Segunda Guerra Mundial. Alguns deles foram banidos há décadas no mundo, como o DDT (Dicloro-Difenil-Tricloroetano), mas continuam sendo encontrados em resíduos de água e solo em várias partes do planeta.

Atualmente, o tema dos agrotóxicos ganha destaque pelo crescente conjunto de evidências científicas de seus malefícios diretos ou indiretos à saúde humana e animal, bem como seus danos ao equilíbrio ecológico decorrentes do uso massivo de herbicidas, inseticidas, fungicidas e outros biocidas sintéticos agrícolas. Os agrotóxicos são encontrados desde a água da chuva até o leite materno ou sangue do cordão umbilical. Por outro lado, várias ações na justiça crescem contra estes produtos.  

Desde 2015, a Agência Internacional de Pesquisas sobre o Câncer (IARC) classificou o glifosato, herbicida mais usado no mundo, como provavelmente cancerígeno. Posição semelhante na mesma época foi declarada, no Brasil, pelo Instituto Nacional do Câncer (INCA). Outras pesquisas apontam este ingrediente ativo, presente no herbicida Roundup Ready, da Monsanto (empresa adquirida pela Bayer) como disruptor endócrino e causador de outras graves doenças. Uma pesquisa apresentada em 2023, pela Escola de Saúde Pública da UC Berkeley, mostra que a exposição na infância ao glifosato está ligada à inflamação do fígado e a distúrbios metabólicos no início da idade adulta, o que pode levar ao câncer de fígado, diabetes e doenças cardiovasculares em fase mais adiantada da vida.

No que toca ao Brasil, seguimos neste milênio como o país com maior consumo de agrotóxicos. Esses venenos são também, equivocadamente, chamados de “defensivos agrícolas”, entretanto matam também outros organismos importantes na teia da vida (polinizadores, inimigos naturais de insetos que podem entrar em desequilíbrio e prejudicar culturas, plantas companheiras, etc.). Da mesma forma, a denominação de “pesticidas” joga de forma indiscriminada um preconceito (especismo) contra, por exemplo, plantas riquíssimas em nutrientes, como o caso do dente-de-leão, portanto, enquadradas, nesta concepção de racismo biológico no rol de "ervas daninhas" ou “pestes”. Quem ganha com essa denominação antropocêntrica preconceituosa, se não as grandes empresas que lucram com a venda indiscriminada de herbicidas, inseticidas ou similares?

Em nosso país, as vendas de ingredientes ativos de biocidas agrícolas correspondeu a 800 mil toneladas em 2022. Soma-se a isso, valores adicionais estimados em 20% de uso de agrotóxicos decorrentes de contrabando. Assim, além do registrado oficialmente no Ibama, com mais este percentual não contabilizado, podemos estar beirando 1 milhão de toneladas de ingredientes ativos de agrotóxicos, sem contar sua mistura com os adjuvantes (produtos para aderir mais às plantas, por exemplo), que também apresentam toxicidade elevada. Ou seja, o Brasil é o maior mercado de venda de venenos agrícolas mundial, representando valores de cerca de 20 bilhões de dólares anuais (47% para soja, 17% para milho, 10% para a cana, 7% para o algodão, entre outros), beneficiando, sobretudo, meia dúzia de oligopólios de produção e venda de agrotóxicos (Bayer, Syngenta, Basf, Corteva, UPL, FMC).
Cabe destacar que entre os dez agrotóxicos mais vendidos no Brasil em 2023, com exceção de três herbicidas (glifosato, 2,4-D e glufosinato de amônio), os demais 7 (sete) são banidos na União Europeia: Acefato (inseticida), Atrazina (herbicida), Clorotalonil (fungicida), Clorpirifós (inseticida), Dibrometo de Diquat (herbicida), Malationa (inseticida) e Mancozebe (fungicida) (Ibama, 2025).


            

Um caso emblemático da flexibilização de agrotóxicos no Brasil é a permissão da presença de glifosato na água de abastecimento em limite 5 mil vezes maior do que na União Europeia, fato destacado pela Professora Larissa Bombardi, especialista no tema.

https://portrasdoalimento.info/agrotoxico-na-agua/

 



A água de abastecimento de Porto Alegre, como outros municípios do Brasil, já apresentou 27 tipos de agrotóxicos. Recentemente, a Fundação Estadual de Proteção Ambiental (FEPAM-RS), monitorando a água do rio Gravataí, registou 39 tipos de agrotóxicos, alguns acima do limite máximo estabelecido para as Classes 1 e 2, sendo a maioria herbicidas em grande parte ligados às lavouras de arroz, ou mais recentemente soja.

Cabe lembrar que na Região Metropolitana de Porto Alegre, mesmo sem nenhum apoio do governo do Estado do Rio Grande do Sul, os assentamentos do Movimento Sem Terra, em Nova Santa Rita, Eldorado do Sul e Viamão, entre outros, são os responsáveis pela maior produção de arroz orgânico da América Latina.

Os últimos resultados do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos (PARA) da Anvisa, em uma dezena e meia de produtos hortigrangeiros, revelaram amostras com resíduos de agrotóxicos em quantidades acima do limite máximo permitido ou mesmo com a presença de substâncias químicas não autorizadas para o alimento pesquisado.  

O mais absurdo de tudo isso é que a agricultura convencional/industrial expande suas mega-lavouras no Brasil para mais de 48 milhões de hectares de monocultura de soja, 22 milhões de hectares de milho, quase todos via plantas transgênicas, como carros chefes do crescimento do uso de agrotóxicos de 371%, em 20 anos, entre 2003 e 2022. Em compensação as áreas de produção de feijão e arroz diminuíram, em 50 anos, em cerca de 40% e 70% respectivamente, desde 1976, enquanto a população brasileira praticamente duplicou no mesmo período. A produção de feijão no Brasil quase não alcança 2% da produção de soja, essa em sua maioria para exportação. A mandioca, planta rústica adaptada às nossas condições edafoclimáicas, muito mais do que o trigo, por exemplo, também vem reduzindo a sua produção. 


 


 

Cotidianamente, estamos ingerindo alimentos com resíduos de agrotóxicos sem um controle necessário por parte dos órgãos como Anvisa, Ministério da Agricultura, Ibama  e órgãos estaduais ligados à saúde, à alimentação e à agricultura. Por outro lado, há de sobra técnicas agrícolas agroecológicas e orgânicas que demonstram a viabilidade de uma agricultura sociobiodiversa e sem venenos, e que também incorpore obrigatoriamente a Reforma Agrária e a Justiça no Campo. Mas, para isso também será necessário que o Brasil se afaste de sua raiz colonial de submissão, ainda presente, via espoliação de recursos naturais (exportação de grãos, minérios e demais commodities).

 

Entretanto, a maior parte das universidades e centros de pesquisa e extensão no tema da agricultura está ainda distante de enfrentar com vigor esta tragédia, o que faz o círculo vicioso da quimicodependência agrícola continuar, como também ocorre com a negligência relativa aos nossos recursos naturais renováveis associados a cada bioma brasileito, transformado em quintais exportadores de grãos para a engorda de animais confinados em outras paragens...

É necessário que se interrompa o financiamento às monoculturas quimicodependentes, sobretudo o chamado Plano Safra, com recursos públicos voltados em grande parte para as grandes lavouras convencionais, em especial a soja entre 2025/26, com aportes de 516 bilhões de reais em forma de juros subsidiados pelo governo federal. Por outro lado, devemos cobrar o Programa Nacional de Redução do Uso de Agrotóxicos, invertendo o investimento, principalmente aplicando-se em agroecologia e fortalecendo, ou fazendo fazer funcionar, a Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (PNAPO, com o banimento dos biocidas agrícolas sintéticos, dominados por empresas experts em quimiodependência agrícola. 

O Brasil, como a maioria dos demais países do Cone Sul ou Sul Global, possui um enorme manancial de alimentos nativos agrobiodiversos, com um patrimônio nacional resguardado e cultivado por povos indígenas e tradicionais, por meio de milhares de plantas alimentícias e de outros usos com manejo sustentável e sociobiodiversos (medicinais, fibras, madeira, lenha, cosméticos, tintoriais, melíferas, artesanato, etc.) negligenciadas pela dominação do círculo vicioso das monoculturas e demais commodities que foram, em grande medida, responsáveis pelo PL da Devastação, agora transformado em uma monstruosa e anticonstitucional Lei 15.190/2025 que visa o ocaso do Licenciamento.

Um Outro Mundo Possível e Necessário só se tornará realidade com o maior envolvimento da sociedade e comprometimentos dos governos e demais agentes públicos, na busca da soberania alimentar sociobiodiversa, associada a cada bioma brasileiro.
Esta mudança necessária será possível também com trabalho digno no campo e na cidade, sem Marco Temporal para as Terras Indígenas, com Reforma Agrária e no controle real destes venenos em nossos alimentos e na água (rastrear a garantia da não existência de resíduos de agrotóxicos), preservando nossa saúde contra produtos que representem riscos à vida diversa, saudável e digna para todos os organismos.



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