Trazemos aqui o caso de três biólogas, entre tantas(os) cientistas e técnicos de diferentes áreas, que foram perseguidos, e também sofreram psicologicamente, por suas posições em defesa do meio ambiente.
Rachel Carson, bióloga marinha e
escritora estadunidense (1907- 1964), lançou em 1962 seu livro “Primavera Silenciosa”, obra emblemática para o movimento ambientalista. A autora se
empenhou em desvendar, com bases científicas, o problema para a saúde humana e
para a natureza de parte dos agrotóxicos, chamados também de "pesticidas", ou biocidas sintéticos,
utilizados na agricultura. Sua batalha em esclarecer os riscos por trás da
utilização de venenos, como o DDT, também incluía a denúncia de lobby por parte
das principais grandes empresas produtoras de agrotóxicos que tentavam negar os
problemas.
Sua luta lhe causou críticas e ataques infundados de parte de agentes
de empresas de agrotóxicos que a chamavam de pseudocientista, buscando
deslegitimar a validade de suas pesquisas e de sua denúncia, para seguirem comercializando sem restrição estes produtos.
Diferentes porta-vozes de várias
corporações e organizações afiliadas à indústria química de biocidas
questionaram a motivação e os argumentos de Carson, atacando a autora de forma
pessoal. A empresa Velsicol Chemical Corporation, uma grande fabricante de DDT,
ameaçou processar a editora do livro Primavera Silenciosa.
Entre os
negacionistas das evidências cada vez maiores levantadas por Carson, decorrentes
dos efeitos prejudiciais dos venenos agrícolas associados à “Revolução Verde”,
destacam-se críticas maldosas do cientista (?) estadunidense William Darby, financiado pela
Fundação Rockefeller. Rachel Carson sofreu muito com este bombardeio de críticas injustas e, adoecida por câncer, faleceu abril de 1964.
https://tapioca.ird.fr/primavera-silenciosa-conheca-o-legado-de-rachel-carson/ |
“Um caminho óbvio para se enfraquecer uma causa é desqualificar a pessoa
que a advoga e defende. Portanto, os mestres do invencionismo têm estado
ocupados: dizem que eu sou uma “amante de pássaros”, “de gatos”, “de peixes”,
uma “sacerdotisa da natureza”, uma “devota do culto místico”, envolvida com leis
do universo, das quais meus críticos consideram–se imunes. Um outro mecanismo
muito conhecido e usado é dar falsas interpretações as minhas posições e passar a
atacar coisas que eu nunca disse. Eu não quero continuar batendo no óbvio, porque
qualquer um que tenha realmente lido o livro sabe que eu não advogo o abandono
completo do controle químico. Minha crítica a este método não é porque ele controla
insetos nocivos, mas, sim, porque ele cria perigosos efeitos paralelos ao fazê–lo.
Eu critico os atuais métodos, porque eles estão fundamentados num patamar de
pensamento científico muito baixo. Nós realmente somos capazes de um grau maior
de sofisticação para solução deste problema”.
Dezembro, 1962.
Rachel Carson. (https://ainfo.cnptia.embrapa.br/digital/bitstream/item/19284/1/Moura.pdf) .
Infelizmente, passadas seis décadas, a situação do uso desses venenos segue se agravando, com o aumento
de milhões de casos de contaminações, inclusive por meio de biocidas agrícolas
detectados no leite materno ou mesmo no sangue de ursos polares, causando doenças e mortes, seguidas pelo
crescimento exponencial do uso de agrotóxicos, em um mercado mundial que
ultrapassa 60 bilhões de dólares/ano. No Brasil, o comércio atinge mais de 13
bilhões de dólares/ano, e o crescimento de seu uso foi de 395% entre 2000 e 2021,
segundo o Ibama (2023).
Débora Fernandes Calheiros, bióloga, pesquisadora e técnica da Embrapa Pantanal, ministrou palestras e elaborou e divulgou documentos alertando para atividades que impactavam o Pantanal.
Entretanto, foi perseguida em 2012 por sua chefia após divulgar estudos que
demonstravam grandes impactos ambientais da possibilidade da construção de 135
hidrelétricas nas cabeceiras do bioma. A bióloga penou por estar cumprindo sua
função essencial de divulgação de seus trabalhos científicos que destacavam os
riscos sobre os ecossistemas hídricos do Pantanal. Teve que recorrer à justiça e
também teve apoio de centenas de pesquisadores brasileiros em um abaixo assinado
em sua defesa.
A bióloga segue defendendo o Pantanal, há mais de três décadas, apesar da
pressão dos empreendimentos hidrelétricos e do agronegócio que vêm comprometendo
o bioma. Ela encaminhou carta ao STF, em 2023, solicitando que os rios tivessem
limitação de empreendimento, inclusive porque destacou que o bioma Pantanal não
é apenas Patrimônio Nacional, pela Constituição Federal, mas também Patrimônio
Natural da Humanidade e Reserva da Biosfera pela UNESCO (2000). Ela iniciou sua
carta ao STF com as seguintes palavras: “Peço desculpas pela ousadia, sou apenas
uma bióloga que estuda há mais de 30 anos os processos ecológicos, no caso,
hidroecológicos que regem o maior sistema de áreas úmidas do mundo. Refiro-me ao
bioma Pantanal, que, pela Constituição do Brasil, é Patrimônio Nacional”.
Mônica
Lopes Ferreira, bióloga, imunologista e pesquisadora científica concursada do
Instituto Butantan, por 30 anos, foi punida por suspensão pela instituição, por
seis meses, por divulgar em 2019 resultado de pesquisas com diferentes doses de
agrotóxicos em peixes-zebra (zebrafish) usados em laboratório.
Foto Plataforma Zebrafish |
Seus resultados demonstraram que doses que eram
consideradas “seguras” para seres humanos, pelos órgãos de controle, causaram mortalidade nos
embriões de peixes. E, surpreendentemente, quando a dose era diluída até mil
vezes em água, os embriões ainda apresentaram anomalias. Além disso, revelou que todos
agrotóxicos, em qualquer quantidade usada, causavam alterações nos peixes e
isso, potencialmente, poderia trazer graves danos à saúde humana. Os agrotóxicos
causaram mortes e malformação de fetos em embriões dos peixes, até mesmo em
dosagens equivalentes a uma trigésima parte do recomendado pela Agência Nacional
de Vigilância Sanitária (Anvisa). As substâncias submetidas aos testes foram o
herbicida glifosato e os inseticidas malationa, abamectina, (também acaricida e
nematicida), acefato, alfacipermetrina, bendiocarb, carbofurano, diazinon,
etofenprox e piriproxifem.
Por serem usados em grande escala no país, os
resultados dos experimentos causaram reação explosiva nos setores do agronegócio e
tal efeito respingou em sua chefia .
Em 2019, o diretor da Anvisa, Renato Porto e a então ministra da Agricultura, Tereza Cristina, chegaram a dar entrevistas
contestando o experimento da pesquisadora Mônica. A bióloga recebeu
um comunicado, em agosto de 2019, proibindo-a de submeter projetos de pesquisa
para aprovação durante seis meses. Entretanto, conseguiu uma liminar do Tribunal
de Justiça de São Paulo que suspendeu a punição.
Monica segue empenhando-se em esclarecer os riscos dos agrotóxicos e o mito de que existe limite seguro no uso destes produtos.
https://www.youtube.com/watch?v=LOzRXm7wn2U
A PERSEGUIÇÃO E/OU ASSÉDIO MORAL NO TRABAHO SÃO CRIMES E DEVEM SER DENUNCIADOS.
O trabalho de um biólogo é muito mais que estudar,preservar e pesquisar a natureza é uma dedicação diária á Vida. É viver deacordo com os princípios básicos do respeito aos seus semelhantes e ao todo (universo) que o cerca. Admiro muito . Parabéns.
ResponderExcluirQue ótima matéria!! Muito importante tornar público as perseguições que aconteceram e acontecem ainda com quem fala em prol do meio ambiente.
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