terça-feira, 9 de maio de 2017

A EXTINÇÃO DA FUNDAÇÃO ZOOBOTÂNICA É INCONSTITUCIONAL

O governo do Estado do Rio Grande do Sul, a partir da aprovação, com apoio parlamentar, da possibilidade de extinção das Fundações Estaduais, entre elas a Fundação Zoobotânica, comete uma enorme ilegalidade. Desconsidera que resguardar a biodiversidade e dar sequência à pesquisa e à manutenção do patrimônio científico, e das políticas públicas associadas a estes, não seja função de Estado. O governo Sartori, quando enviou em regime de urgência de 30 dias, no final de novembro de 2016, o projeto 246/2016, que visava a extinção de 9 fundações, colocou-se fora da Lei, ou sem perceber, ou mesmo por desafiar a Justiça. Jogou fora a Constituição Federal e Estadual e as Leis anteriores, conquistadas a duras penas. Cometeu ataque ao princípio, consagrado no âmbito jurídico internacional, da vedação do retrocesso em políticas socioambientais. Alegar falta de recursos e considerar que a função do Estado é somente a Saúde, a Educação, a Segurança e a Infraestrutura, para o que chama de desenvolvimento, áreas supostamente em atendimento, portanto, além de ilegal é medida pouco inteligente. Dentro das funções de estado está também a Biodiversidade e o Meio Ambiente, (Art. 225 da Constituição Federal e Art. 251 da Constituição Estadual).
Deixamos aqui, para os interessados, e quiçá o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul faça eco a estes pleitos Constitucionais, alguns destes itens legais desconsiderados pelo PL 246, agora Lei 14.982 de 16 de janeiro de 2017:

EXTRATO PRELIMINAR DE LEIS ESPECÍFICAS REFERENTES AO PAPEL DA FUNDAÇÃO ZOOBOTÂNICA DO RIO GRANDE DO SUL
(OBS. em vermelho são destacadas atividades exclusivas ou predominantemente realizadas pela FZB, em negrito escuro atividades compartilhadas)

CONSTITUIÇÃO ESTADUAL DO RIO GRANDE DO SUL
Art. 251. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo, preservá-lo e restaurá-lo para as presentes e futuras gerações, cabendo a todos exigir do Poder Público a adoção de medidas nesse sentido.
(Vide Leis n. 9.519/92 e 11.520/2000) 
§ 1.º Para assegurar a efetividade desse direito,  o Estado desenvolverá ações permanentes de proteção, restauração e fiscalização do meio ambiente, incumbindo-lhe, primordialmente: [...] 
 II - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais, obras e monumentos artísticos, históricos e naturais, e prover o manejo ecológico das espécies [ex-situ] e ecossistemas, definindo em lei os espaços territoriais a serem protegidos; [...]
IV - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a proteção do meio ambiente; [...]
VI - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético contido em seu território, inclusive mantendo e ampliando bancos de germoplasma [ex-situ], e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e à manipulação de material genético;
VII - proteger a flora, a fauna e a paisagem natural, especialmente os cursos d’água, vedadas as práticas que coloquem em risco sua função ecológica e paisagística, provoquem extinção de espécie ou submetam os animais a crueldade;
(Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 38, de 12/12/03
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Lei 11.520/2000 – CÓDIGO ESTADUAL DE MEIO AMBIENTE
Art. 158 - O Estado manterá e destinará recursos necessários para os órgãos de pesquisa e de fiscalização dos recursos naturais.
Art. 160 - O Estado, através dos órgãos competentes, fará e manterá atualizado o cadastro da flora, em especial das espécies nativas ameaçadas de extinção.
Art. 166 - A política sobre a fauna silvestre do Estado tem por fim a sua preservação e a sua conservação com base nos conhecimentos taxonômicos, biológicos e ecológicos
Art. 167 - Compete ao Poder Público em relação a fauna silvestre do Estado:
 I - facilitar e promover o desenvolvimento e difusão de pesquisas e tecnologias;
II - instituir programas de estudo da fauna silvestre, considerando as características sócio-econômicas e ambientais das diferentes regiões do Estado, inclusive efetuando um controle estatístico; (pag 77)
III - estabelecer programas de educação formal e informal, visando à formação de consciência ecológica quanto a necessidade da preservação e conservação do patrimônio faunístico;
VI - instituir programas de proteção à fauna silvestre;  VII - identificar e monitorar a fauna silvestre, espécies raras ou endêmicas e ameaçadas de extinção, objetivando sua proteção e perpetuação
VIII - manter banco de dados sobre a fauna silvestre; 
IX - manter cadastro de pesquisadores, criadores e comerciantes que de alguma forma utilizem os recursos faunísticos do Estado; 
X - manter coleções científicas museológicas e “in vivo” de animais representativos da fauna silvestre regional, assim como proporcionar condições de pesquisa e divulgação dos resultados da mesma sobre este acervo;

Art. 168 - São instrumentos da política sobre a fauna silvestre:
 I - a pesquisa sobre a fauna;
II - a educação ambiental;
 III - o zoneamento ecológico;
IV - o incentivo à preservação faunística;
V - o monitoramento e a fiscalização dos recursos faunísticos;
VI - a legislação florestal do Estado do Rio Grande do Sul;
VII - as listas de animais silvestres com espécies raras ou ameaçadas de extinção e endêmicas;
VIII - programas de recuperação e manutenção dos “habitats” necessários à sobrevivência da fauna;
 IX - as Unidades de Conservação;
X - o licenciamento ambiental.
Art. 169 - O Poder Público promoverá a elaboração de listas de espécies da fauna silvestres autóctone, que necessitem cuidados especiais, ou cuja sobrevivência esteja sendo ameaçada nos limites do território estadual.
Art. 176 - O Poder Executivo Estadual incentivará e regulamentará o funcionamento de Centros de Pesquisa e Triagem Animal, com a finalidade de receber e albergar até sua destinação final, animais silvestres vivos, provenientes de apreensões ou doações.
Art. 183 - Os elementos constitutivos do Patrimônio Ambiental Estadual são considerados bens de interesse comum a todos os cidadãos [citados inclusive na Lei 246/2016], devendo sua utilização sob qualquer forma, ser submetida às limitações que a legislação em geral, e especialmente esta lei, estabelecem.
Art. 184 - O Poder Público deverá manter bancos de germoplasma [coleções ex situ no JB, ZOO e MCN, serpentes?] que preservem amostras significativas do patrimônio genético do Estado, em especial das espécies raras e das ameaçadas de extinção.
Art. 185 - Compete ao Estado a manutenção da biodiversidade pela garantia dos processos naturais que permitam a conservação dos ecossistemas ocorrentes no território estadual.
Art. 186 - Para garantir a proteção de seu patrimônio genético compete ao Estado:
 I - manter um sistema estadual de áreas protegidas representativo dos diversos ecossistemas ocorrentes no seu território;
II - garantir a preservação de amostras [incluindo conservação ex situ] dos diversos componentes de seu território genético e de seus habitantes. (pag 81)

CAPÍTULO VIII - Do Patrimônio Paleontológico e Arqueológico
Art. 187 - Constitui patrimônio paleontológico e arqueológico, estes definidos pela Constituição e legislação federais, o conjunto dos sítios e afloramentos paleontológicos de diferentes períodos e épocas geológicas, e dos sítios arqueológicos, pré-históricos e históricos de diferentes idades, bem como todos os materiais desta natureza, já pertencentes a coleções científicas e didáticas dos diferentes museus, universidades, institutos de pesquisa, existentes no território estadual.
Art. 188 - Compete ao Estado a proteção ao patrimônio paleontológico e arqueológico, objetivando a manutenção dos mesmos, com fins científicos, culturais e sócio-econômicos impedindo sua destruição na utilização ou exploração.
Art. 189 - Para garantir a proteção de seu patrimônio paleontológico e arqueológico, compete ao Estado:
 I - proporcionar educação quanto à importância científica, cultural e sócio- -econômica deste patrimônio;
III - prestar auxílio técnico e financeiro a museus e instituições científicas para adequada preservação do material fóssil e arqueológico;
IV - cadastrar os sítios arqueológicos e paleontológicos e as áreas de sua provável ocorrência, em todo o Território Estadual, dando prioridade aos existentes em Unidades de Conservação.
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DECRETO EST. 52.109/2014 E O DECRETO EST. 51.797, DE 08/2014, definem as Listas da Flora Ameaçada do RS e a  Lista da Fauna Ameaçada do RS.  O Art. 4 dos dois Decretos é muito semelhante, destacando-se aqui o referente à fauna ameaçada - que define quea reavaliação periódica da lista ficará sob a responsabilidade da Secretaria do Meio Ambiente, a qual, após consulta às universidades e instituições de pesquisa em biodiversidade, constituirá Comissão Técnica formada por renomados especialistas em fauna, com conhecimento e experiência de campo no Estado do Rio Grande do Sul, para, sob a coordenação da Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul. Parágrafo único.
A Comissão Técnica será designada pelo Secretário de Estado do Meio Ambiente e desdobrar-se-á, minimamente, nos seguintes grupos temáticos: I - mamíferos; II -aves; III - répteis; IV- anfíbios; V-peixes; e VI -invertebrados.
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Decreto Estadual 51.109/2014, Lista da Flora Ameaçada do RS,
Art. 4º - A reavaliação da lista ficará sob a responsabilidade da Secretaria do Meio Ambiente, a qual a cada quatro anos, após consulta à Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul - FZB, às universidades e às instituições de pesquisa em biodiversidade constituirá Comissão Técnica formada por renomados especialistas em flora, com conhecimento e experiência de campo no Estado do Rio Grande do Sul, para, sob a coordenação da Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul: I – definir o roteiro metodológico a ser adotado na revisão da lista, garantindo o aprimoramento dos procedimentos e mantendo critérios técnico-científicos compatíveis com os padrões internacionalmente reconhecidos; II – coordenar tecnicamente o processo de reavaliação do estado de conservação das espécies da flora do Estado do Rio Grande do Sul; III – manter a base de dados atualizada com informações relevantes à avaliação do estado de conservação das espécies, tais como a localização e o mapeamento dos registros, a ocorrência em Unidades de Conservação, principais ameaças e ações de conservação recomendadas.
Art. 7º diz que: Compete à Secretaria do Meio Ambiente
I - estabelecer medidas urgentes para a conservação das espécies constantes dos Anexos deste Decreto, em especial as das categorias CR e EN, promovendo a articulação de ações com institutos de pesquisa, com universidades, com órgãos estadual e federal que tenham por objetivo a investigação científica e a execução de programas de pesquisa, de proteção, de preservação e de conservação da biodiversidade;
II - dar ampla publicidade às listas publicadas em anexo, promovendo a sua divulgação junto às instituições afetas ao tema da conservação da natureza e à população em geral;
 III - estimular a elaboração de políticas integradas de controle e de fiscalização ambiental, incluindo as esferas municipal e federal, no sentido de monitorar e de coibir o tráfico e a extração ilegal de espécies da flora nativa ameaçada;”.
IV - enviar ao Centro Nacional de Conservação da Flora – CNCFlora, a lista constante nos Anexos deste Decreto, para auxiliar nas futuras revisões da Lista Oficial de Espécies Ameaçadas de Extinção da Flora Brasileira.
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Lei 9.519/1992 – CÓDIGO FLORESTAL ESTADUAL DO RIO GRANDE DO SUL
Art. 3º - São objetivos específicos da política florestal do Estado:
[...] X - identificar e monitorar as associações vegetais relevantes, espécies raras ou endêmicas e ameaçadas de extinção, objetivando sua proteção e perpetuação;
XI - implantar um banco de dados que reúna todas as informações existentes na área florestal [entendendo-se florestas e campos como ecossistemas naturais];
Art. 35º - O órgão florestal competente [hoje o DBIO da SEMA] deverá proibir ou limitar o corte das espécies vegetais consideradas em via de extinção, raras ou endêmicas [requer apoio técnico da FZB], delimitando as áreas compreendidas no ato. Parágrafo único - O órgão florestal competente [requer apoio técnico da FZB] deverá divulgar relatório anual e atualizado das espécies raras ou endêmicas e ameaçadas de extinção.
Art. 42 - Para os fins previstos nesta Lei entende-se por
[...] II - espécie ameaçada de extinção: espécie em perigo de extinção, cuja sobrevivência é improvável, se continuarem operando os fatores causais. Inclui populações reduzidas em níveis críticos e habitats drasticamente reduzidos;

III - espécie rara ou endêmica: espécie de ocorrência limitada a certos ambientes ou com auto-ecologia restrita a um habitat específico (o mesmo que endemismo);
Como exemplo da impossibilidade de cumprimento dos preceitos constitucionais e legais, mesmo com a eventual extinção da Fundação Zoobotânica, vejamos o exemplo do Art. 158 do Código de Meio Ambiente, Lei 11.520/2000: "Art. 158 - O Estado manterá e destinará recursos necessários para os órgãos de pesquisa e de fiscalização dos recursos naturais" .

- Situação atual, com a FZB, a fim de atender o art. 158 (Lei 11.520/2000): Atualmente a FZB, por meio do Museu de Ciências Naturais, Jardim Botânico e Zoológico, mantém estudos e pesquisas taxonômicas, biológicas e ecológicas fundamentais tanto básicas como aplicadas com flora, fauna e outros grupos de organismos, inclusive bioindicadores, realiza estudos para elaboração e planos de Manejo de Unidades de Conservação, com corpo técnico gabaritado, formado por especialistas e pessoal técnico, inclusive taxonomistas, com alta experiência nos grupos de vegetais e animais silvestres e coleções científicas. A FZB obtém recursos para pesquisa do CNPq e FAPERGS e organismos internacionais para dar sequência às pesquisas em biodiversidade e coleções científicas.

- Situação hipotética de incorporação das atividades da FZB pela SEMA a fim de atender o art. 158 (Lei 11.520/2000): A Sema sozinha não dispõe de taxonomistas que entendam dos grupos de flora e fauna, nem de pesquisadores com perfil para coleções científicas. Sem a instituição, dificilmente teria condições de obter recursos externos em projetos, como existe hoje, para manter a expertise na área. Sem a FZB, atuaria de forma restrita na fiscalização.

- Situação hipotética de substituição dos serviços hoje executados pela FZB por Consultorias, a fim de atender o art. 158 (Lei 11.520/2000):
Os consultores, em contratos temporários, muito dificilmente terão a experiência dos técnicos especialistas nos grupos de flora, fauna e outros organismos. Cabe lembrar que a eventual terceirização na saúde comprovou-se um altíssimo risco de descontinuidade de serviços, pois o Estado tem fragilidades contratuais enormes e alega dificuldades de pagamento de serviços, trazendo enorme insegurança aos serviços essenciais previstos nas Constituições Federal e Estadual. A interrupção, recorrente na área de saúde, se ocorrer na área da biodiversidade significaria a falta de atendimento diário para cuidados com plantas e animais silvestres, centenas destes ameaçados de extinção, o que representaria possibilidade muito alta de morte de exemplares de espécies inclusive ameaçadas, com responsabilização de quem? 

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